O casal de filipinos em casa de quem estivemos, a Michele e o Nep Bondoc-framed |
Já
estou melhor da arreliadora constipação que me afectou a disposição e a energia
que queremos ter quando a fome de conhecer uma terra nova se quer sobrepor às naturais
limitações. Ah pois... já sou um sexagenário!!!
O
pai da Bianca havia-me dado há tempos atrás, uns tubos de vitamina C, dois dos
quais eu decidi trazer para estas paragens não fosse o diabo tecê-las... et
voilà, a coisa resultou em pleno! Bem Hajas amigo Álvaro. Tenho saudades
daqueles nossos almoços de Domingo seguidos de animada visita ao teu grupo de
confrades, no cafezinho da Amadora! Recebe um saudoso e apertado abraço!
Lembrei-me
das supostamente “infalíveis” receitas da milenar medicina chinesa, a propósito
de como funcionam os serviços médicos na China. É uma daquelas fórmulas que
penso terá desvantagens, mas seguramente muitos argumentos a favor, sobretudo
num país como Portugal...
Então
é assim: Os cidadãos todos os meses pagam ao seu médico de família um pequeno
montante, uma insignificância, como recompensa pelos conselhos, pelos cuidados
básicos, pelas dicas e pequenas informações que os clínicos sejam chamados a
dar. Porém, esses pagamentos ficam suspensos sempre que o cidadão adoece, só
sendo retomados quando o cidadão está de novo curado e em perfeitas condições
de saúde. Serve o sistema para enaltecer a medicina preventiva e para
recompensar o médico da sua primordial função – manter sãos os cidadãos da sua
comunidade.
Achei
perfeita a solução chinesa e imaginei de imediato a aplicação da mesma medida
aos médicos em Portugal! Hem... que tal? Ora digam-me lá, se não seria muito
bem visto! Provavelmente melhor para todos – os médicos, até poderiam auferir ainda
mais dinheiro, ser menos mercantilistas e manter os seus elevados níveis de
ambição e abastança e, por sua vez, os pacientes não contestariam o que
pagassem porque se mantinham sãos. Os doentes, deixavam de pagar, não
frustrando as suas expectativas, até porque normalmente se está doente numa
fase da vida em que as capacidades de ganhar dinheiro e multiplicar os recursos
se reduziram. De facto, a medicina deveria servir primordialmente para nos
manter sudáveis e não para nos curar de doenças.
Abençoada Sabedoria Milenar Chinesa!!!
SHALOM
Ellen
Entretanto,
provando gulosamente uma sobremesa oriental à base de caramelo, confeccionada
pela matriarca da família de filipinos cá da casa, a Júlia Bondoc, caíu-me uma
corôa de um dente, já duas vezes reparado com a infinita paciência de um
dentista brasileiro da Malveira – o Dr. Alexandre, do Consultório Picon &
Mendes – aliás o mesmo a que recorre o meu amigo e inexcedível companheiro José
Pinheiro, de quem tenho também muitas saudades! (e o tradicional gesto cristão
do “em pé é bom, deitado ainda é melhor!”).
Bom,
face ao “infortúnio” e perante a infeliz e inestética expectativa de andar
desdentado pela terra dos cangurus, decidi pedir ajuda à dona da casa – a
simpática Michelle, Assistente de dentista num consultório de Sydney – o
Sailors Bay Dentistry – para me dar indicações e salvar a honra deste português
saloio da Malveira em visita a terras do
sul (que é exactamente o que significa etimologicamente a designação
Austrália), ao que ela de imediato se solidarizou aconselhando-me a consultar a
dentista para quem ela trabalha – uma judia askenasi de 50 anos, de nome Ellen,
que visitei dois dias depois.
Quando
cheguei ao estabelecimento clínico senti dois arrepios pela espinha acima,
primeiro pelos motivos dentários óbvios... e depois, porque o “chique” da
clínica fez-me supor que iria ficar financeiramente depenado naquela manhã!
Tratei logo de colocar a minha estrela de David por fora da camisola para que
ela se apercebesse sem grandes diálogos, da minha ascendência judaica.
Entretanto,
no “foyer” da luxuosa clínica privada, enquanto aguardava ser chamado, passei
os olhos por um diário de Sydney e eis senão quando me apercebo que pelos
altifalantes passavam temas musicais familiares – dois “chorinhos” brasileiros,
que me trouxeram um pedacinho do calor humano latino e dessas terras de Santa
Maria que um dia Vasco da Gama descobriu... (não, não é engano, não foi Pedro
Álvares Cabral quem a descobriu em 1500, mas sim Vasco da Gama em 1498, na sua
viagem a caminho da Índia... mas isso agora não vem a propósito), e SURPRESA –
logo após, escuto a primeira voz portuguesa desde que cheguei à Austrália – pelos
altifalantes vem a voz de Roberto Leal, num antigo album seu ainda com
trejeitos brasileiros na voz! Fiquei tão contente que julgo que a senhora da
Recepção deve ter achado que eu faria parte da banda sonora daquele “filme”! Cá
por mim preferia ter ouvido ali os Azeitonas a cantar “Anda comigo ver os
aviões”!
Lá
chegou a minha vez e a própria Drª Ellen veio cá fora buscar-me, trajando uma
elegante bata verde. Olhou e viu logo a estrelinha a brilhar. Sorriu num largo
sorriso iluminado pelo sentimento de quem compartilha a fé e cumprimentou-me
com um familiar Shalom Luis!
Conversa
de circunstância, quis saber da comunidade judaica de Portugal, referiu o que
Inquisição fez em Lisboa e em Évora, (pasmem, mas os judeus são muito ciosos da
sua dignidade all over...), criticou
a ausência das Sinagogas por parte dos Sefarditas (hábito comum a todos os
Sefarydin, desde a Península Ibérica ao próprio território de Israel), falou-me
da terra do leite e do mel e eu, por outro lado, actualizei-a referindo a
tolerância do moderno Portugal, falei-lhe dos exageros e fundamentalismos de
alguns dos Askenasi e obviamente recordei-lhe alguns exemplares rabinos
Sefarditas. Fez o tratamento esperado com esmero, carinho adicional e fez um expressivo
desconto! (Não fiquei na miséria...).
Ontem
enviei-lhe uma missiva a agradecer a atenção e a solicitar-lhe o empréstimo de
uma Menorah (candelabro de sete velas, tradicional de Israel), para o meu
casamento a 13 de Outubro. Com o acordo explícito da Bianca, decidimos
convidá-la para o casório!
T3AM
A
Bianca deixara o Ford Fiesta estacionado num parque privativo destinado aos
clientes da Clínica da Sailors Bay Dentistry e portanto não houve que pagar
estacionamento, nem correr riscos de multas!
Decido
apesar de tudo verificar se os sinais de trânsito estavam ou não, homologados
pela municipalidade.
Todos, sem excepção! Penso em Mafra, onde, por uma questão
nunca esclarecida, mas certamente muita teimosia do município, se insiste em
não se tornar pública a homologação dos sinais de trânsito. Lembro-me da
quantidade de cartas trocadas com o autista responsável pelo gabinete jurídico
da Câmara Municipal de Mafra. Por mais argumentos jurídicos que eu lhe remeta,
defende-se sempre com o mesmo grupo de raciocínios viciosos e redutores que
utiliza para defender a estúpida e dispendiosa ideia da criação de uma evitável
Polícia Municipal em Mafra. Quem a teve, deve dizer-se, não foi sequer o José
Ministro dos Santos, mas um tonto, muito cheio de si, agora candidato à
presidência da Câmara, um tal Hélder qualquer coisa... que nem me lembro do
apelido do animal!
Já
agora, e por curiosidade, devo acrescentar que os municípios de Lisboa,
Amadora, Coimbra e Porto – estes, pelo
menos – têm os seus sinais correctamente implantados e conforme determina a lei
– devidamente homologados.
No
caminho de regresso a casa, visualizo pintadas no piso da estrada, umas
indicações que não conheço e mencionam: T3AM.
Pergunto
à Bianca (que devo aqui esclarecer, é uma excelente condutora) o que significa
aquilo e ela diz-me com um sorriso que corresponde a uma determinação em uso no
estado de New South Wales – a exigência de que em algumas vias com mais
movimento de distribuição de tráfego rodoviário, de 2ª a 6ª feira, entre as 6h
e as 10h e entre as 15h e as 18h, as viaturas ligeiras só possam circular com
pelo menos três passageiros (condutor + dois), promovendo assim que haja também
um certo espírito cooperativo entre colegas de trabalho, evitando-se algum
excesso de trânsito e aquilo que se vê comummente nas entradas de Lisboa, em
horas de ponta: montanhas de viaturas com uma só pessoa, numa exorbitância
bacôca e ridícula, evitável por exemplo, através de medidas inteligentes como
esta que refiro. Viva a T3AM!
APOIO
ao Empreendedorismo e Jovens Empresários
Ainda
com a cabeça cheia de receitas e reivindicações dos sindicalistas portugueses,
sentenças dos parlamentares portugueses, discursos e promessas dos políticos portugueses,
análises dos jornais e comentadores (politólogos, como agora pomposamente se
diz), dou comigo, numa das mais movimentadas avenidas de Parramatta, a olhar
incrédulo para um outdoor pendurado
de cima a baixo, num prédio de magnífica visibilidade, com um cartaz anunciando
uma acção governamental que visa promover o empreendedorismo dos jovens,
atribuindo-lhes subsídios de apoio à criação de pequenas novas empresas, que
não só lhes abram uma carreira profissional, como dêem emprego a outros jovens,
também candidatos a um 1º emprego. O engraçado é que o cartaz não se limita a
trazer a menção à medida governamental e respectivo logotipo – não... vai bem
mais longe e anuncia que a metros dali, o fulano tal (com o nome e
fotografia) é agora o responsável por um café aberto e equipado com o apoio
dessa nova medida governamental, convidando a população a ir conhecê-lo ao seu
café, a ser cliente e a apoiá-lo neste início de carreira. Quase me chegaram as
lágrrimas aos olhos – eh pá, sim senhor, isto sim, isto é que é apoiar e
incentivar, simultaneamente responsabilizar o próprio jovem empresário e também
a população que, perante tal cartaz, não tem desculpa para argumentar que não
sabia...
Ideia
sensacional e que também poderia ser adoptada entre os “tugas”!!!
Hoje
é 5ª feira, dia 6 de Setembro e por ser 5ª feira, é dia de sair e fazer
compras, porque se estabeleceu que todas as casas comerciais ficam abertas até
mais tarde, permitindo que a população que vive mais longe, ou que trabalha com
horários de saída tardios, possa também usufruir das múltiplas vantagens de um Shopping que apresenta as opções mais
variadas e específicas, para todas as bolsas. Os grandes supermercados estão
abertos até à meia-noite e as lojas que normalmente encerram às 18 horas, estão
hoje abertas até às 21h.
Assim
se desenvolve o negócio, assim se incentiva o comércio, assim se enriquece a
população, assim se criam padrões de saudável concorrência. É capitalismo, mas
assume-se que sim, sem aquela doentia dicotomia permanente de se ter uma
constituição e moral de esquerda e necessidades económicas e padrões de consumo
de direita – onde é que já vi disto?
Muradali
Jivan
Por
Internet, este nosso mundo fica pequeno e as dimensões reduzem-se à distância
de um simples click que nos
transporta automaticamente, se preciso for, a milhares de quilómetros de
distância.
O
meu amigo e padrinho (de um casamento já dissolvido, é certo, mas ainda assim,
meu padrinho) João Pedro Jadauji enviou-me por mail as coordenadas de um seu
amigo e conterrâneo (Nampula, Moçambique), José Muradali Jivan, residente
algures na Austrália.
Contactei-o
de imediato e logo de seguida recebo um telefonema com aquela alegria que só os
moçambicanos sabem colocar nos primeiros acordes de um telefonema. Alô? Estás
porreiro? Daqui Muradali Jivan, amigo do João Pedro! E assim de repente estava
em Moçambique, minha terra-natal, a milhares de quilómetros de distância, a n
horas de fuso horário, mas ali consubstanciada aquela terra bendita pela
comunicação estabelecida através de um telemóvel.
O
Muradali Jivan, que não conheço pessoalmente, mas que num repente passou a ser
um amigo disposto a ajudar-me, ali estava a dizer-me que vive do outro lado da
Austrália, numa cidade nova, onde também há muitos portugueses, Perth, grande
porto de mar e capital do estado de West Australia. Conversámos, trocámos
ideias e fixei um aviso importante que o Muradali Jivan me deixou: Luis, eh pá,
tem cuidado com os portugueses que vivem cá! Não é todos, mas alguns são uns
sacanas e inventam situações sobre outros, na expectativa de os prejudicar e
fazer com que eles arranjem complicações com as autoridades e percam os
empregos para eles depois aparecerem como abutres e ficarem com esses empregos.
OOOOPSSSS.... fiquei alerta! Obrigado Muradali Jivan, vou ter cuidado!
Infelizmente as mentalidades pequenas permanecem pequenas mesmo quando os
corpos se mudam para terras grandes e de futuro. A mesquinhez não se despega
nas alfândegas!
Uma
vez que estas singelas crónicas são lidas em Portugal por muitos amigos meus,
designadamente por malta de Moçambique, em particular por amigos de Nampula,
Beira, António Enes, e outras saudosas paragens, desde já me disponho a ceder
os contactos do Muradali Jivan a quem objectivamente mos peça. Disponham.
Sandra
Sorgentini e Neville Ritchie
Quando
era miúdo e vivia em Lourenço Marques (vivi lá até aos meus 18 anos), perto de
minha casa havia um formidável Hotel que fazia concorrência ao famosíssimo
Polana Hotel, ainda hoje considerado o melhor hotel do continente africano e um
dos melhores do mundo. Actualmente o Polana faz parte de uma cadeia de hotéis
pertença do chefe ideológico e religioso dos Ismaelitas, um filantropo
extraordinário e que já esteve por diversas vezes em Portugal – Aga Khan.
Ora,
esse tal hotel, apesar de ser de menor grandeza do que o Polana, fazia-lhe uma
certa concorrência. Era o Hotel Cardoso, cujo dono era um tal Senhor
Sorgentini, de nome iataliano e que tinha duas filhas, teenagers, bonitas,
apetitosas... Uma era a Jenny, a outra a Sandra. Claro que todos queriamos
namorar com uma ou com outra... O costume nas pequenas terras...
Os
anos passaram e com a guerra, os Beatles, a Universidade na Metrópole, o 25 de
Abril, o diabo-a-sete, aconteceu a diáspora dos Moçambicanos e perdemos o rumo
e os contactos uns dos outros, acabando por nos afastar irremediavelmente...
para sempre! A menos que... um milagre aconteça! Aconteceu!!!
Ainda
em Portugal, a dois, ou três dias de embarcar para Sydney, fui jantar a casa de
dois grandes amigos de Lourenço Marques – a Marina Conceição e o José Luis
Botelho de Sousa, que vivem na Parede, perto de Paço D’Arcos. Ela, é
simplesmente a minha amiga mais antiga e uma das minhas melhores amigas de
sempre, com quem brincava aos 7, 8, 9,
até aos 12 anos de idade, íamos juntos para as aulas, voltávamos juntos, numa
altura em que nem sequer se pensava em namoros, a inocência era total, a
intimidade fraternal, a confiança infinita, a bondade indiscutível. Tinhamos os
mesmos gostos, as mesmas aflições, da entrega dos pontos, das chamadas, das
notas! Tinhamos como refúgio umas “instalações” que arranjámos nos ramos de uma
árvore do quintal da casa da Marina. Nas festas de anos a que íamos juntos,
gostávamos dos Beatles, da Françoise Hardy, do Adamo, do Gene Rockwell... Valemo-nos
um ao outro! (Cabe aqui um parêntesis para homenagear a sua mãe, a minha
querida Dona Elvira, uma alma cheia de ternura e bondade). A Marina era obviamente
excelente aluna, eu nem por isso! Hoje somos amicíssimos e adoramo-nos! Os
nossos pais eram amigos e vizinhos. A Marina tinha um irmão, o João Paulo, na
altura com 3 ou 4 anitos a quem não ligávamos pêva! Hoje é um notável causídico
e (imagine-se) AVÔ!!! O Zé Luis era filho de um homem a quem o turismo de
Moçambique ainda hoje deve muito, deve o que hoje é: Botelho de Sousa.
Hoje Moçambique é talvez a maior potência turística da Costa leste de África. O
Zé Luis é mais velho que eu e, claro está... nessas idades, quatro, ou cinco
anos fazem uma enorme diferença! Só convivemos já em Portugal e só desde então
somos bons amigos. Daí o tal jantar de despedida, antes da minha viagem para
terras do fim-do-mundo!
Nesse
jantar a Marina fala-me da sua maior amiga – agora a viver na Austrália, casada
com um advogado sul-africano – Sandra Sorgentini! O quê?A Sandra? Tu não me
digas! Eu pensava que ela estava no Brasil! Não, ela foi para a Africa do Sul e
depois.......
Ok!
Toda a Diáspora tem a alegria dos possíveis reencontros. Fiquei com as
coordenadas da Sandra, agora casada com Neville Ritchie, que chegou a tentar
viver em Lisboa, depois em Londres, de novo em Joanesburg e agora, perto de
Sydney, em Port Stephens, uma das praias mais elegantes do estado de New South
Wales (cuja capital é Sydney), onde, por coincidência, a Bianca costumava
passar férias com os filhos, quando estes eram irrequietos teenagers!
O
mundo é grande, mas o amor ajuda a encurtar as lonjuras!
Já
cá estou há um mês, porém só agora vai ser possível estar com a Sandra e
conhecer o Neville, que é o maior empresário australiano de uma substância
conhecida por coque – um derivado do
carvão e fundamental na produção e têmpera do aço.
Depois
conto tudo! Mas vai ser divertido e estou a preparar-me para levar o laptop com imagens de Moçambique –
actuais e (evidentemente...) do nosso tempo! Ah e a Manuela Bravo a cantar o
Kanimambo do João Maria Tudella (falecido em 2011, em Lisboa).
Nostalgia,
nostalgia!
Este
vosso amigo de sempre Luis
Arriaga,
Sydney,
aos 6 de Setembro de 2012.
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